Monday, July 23, 2007

Vera Santos, uma amiga.

Terça-feira, 17 de Julho de 2007

Para onde vai o que desaparece?


© Henrique Figueiredo

Alguns dias depois de Vera Santos (Porto, 1973) começar a sua residência no Sítio das Artes sofreu uma lesão no menisco, enquanto dançava. «É o que de mais comum pode acontecer a um bailarino ou a um jogador de futebol», diz a sorrir. Explica que isso não a impediu de continuar o seu trabalho e que «as coisas apenas tomaram outra direcção.»

O seu primeiro projecto coreográfico surgiu em 1999, a partir das histórias que a avó lhe contava, vezes sem conta, usando muito as mãos e repetindo os mesmo gestos, sempre nos mesmos momentos. Em palco, o guião que Vera elaborou não teve exactamente o resultado que pretendia. Por isso decidiu fazer uma segunda experiência. Surge entretanto o Curso de Coreografia do Programa Gulbenkian Criatividade e Criação Artística. Ter sido seleccionada entre muitos outros candidatos foi um sinal de que este era «um caminho a seguir». É na sequência dessa formação que desenvolve um novo projecto, como segunda parte do que tinha feito com a avó. Só que desta vez a neta estava sozinha. Chamou-lhe "Ausência (memória descritiva)" - é possível ver imagens em DVD no CAMJAP - e Vera descreve a peça, que também interpreta, como um «dueto com o espaço». Há um relacionamento com os objectos, com as memórias a partir das quais se recria o que está ausente. No momento final, Vera simplesmente desaparecia do palco, apanhando de surpresa os espectadores. Perante esta ausência repentina, o público ficava em suspensão. Esta reacção foi também surpreendente para a coreógrafa e intéprete. E assim decide dar continuidade ao projecto, criando uma terceira parte: "Desaparecimento". E o que desaparece? É o intérprete? É o espaço? Ou é o próprio público?

De onde vem a força dessa ausência? Transpondo o âmbito do espectáculo, Vera relembra que esse 'não-estar' é muito utilizado estrategicamente pelos políticos, quando se retiram de cena em determinados momentos-chave. E aplica-se também a outras dimensões da nossa vivência em sociedade. No seu trabalho, Vera quer que o público se envolva. Como? - é a questão que se tem colocado. Ela sabe no entanto aquilo que não quer fazer: nem truques de ilusionismo nem provocar constrangimento nos espectadores, apesar de desejar a sua participação.

Para o Open Studio de 28 de Julho, Vera está a preparar uma série de acontecimentos no espaço (em princípio também vai utilizar o vídeo), onde surgem coisas desaparecidas. Trabalha-se a ideia de perda, estabelece-se um jogo entre apagar e ser apagado, e cria-se uma estranheza entre o que pode e não pode acontecer.

Já depois de termos dado a conversa por terminada, voltamos atrás para perguntar se o que está a preparar é "performance". Vera sorri, hesita, diz-nos que tem pensado nisso. Meia-hora depois chega o veredicto por telefone: «É dança. Estou a preparar uma dança para este espaço.» Que é para onde vão as coisas quando desaparecem.



No comments: